Mediação Online

por Caetano Maia

2020 será, sem dúvida, o ano do marco histórico efetivo dos procedimentos autocompositivos on-line no Brasil, advento forçado pela pandemia mundial do Covid-19. Mediação e Conciliação de conflitos e disputas são super demandadas como resultado das múltiplas facetas negativas oriundas das quarentenas e isolamento social forçado, e do cataclismo causado aos contratos e a toda a cadeia produtiva econômica brasileira. Rapidamente é publicada a Lei da Conciliação e Mediação não presencial – nº 13.994/2020, que veio alterar a Lei nº 9.099/1995 para agora possibilitar a mediação e conciliação não presencial no âmbito dos Juizados Especiais Cíveis, e por consemelhança e extensão, também nas Câmaras privadas de mediação e conciliação. Esse é o pano de fundo que nos impulsiona a colocar em prática efetivamente a mediação on-line – à distância.

Nosso objetivo aqui é levantar as principais questões, dúvidas e problemas esperados ou previstos para o procedimento de mediação on-line, sem esgotar nem questões nem respostas, mas sim formando um escopo para a discussão que será a base para a construção de protocolos mais definitivos que possam emprestar ao novo instituto de Mediação On-line determinados padrões de qualidade, forma e ação, proporcionando segurança, técnica apurada e eficácia reais ao procedimento.

FRASES-CHAVE: mediação e conciliação não presencial, mediação judicial e extrajudicial de conflitos e disputas, mediação de conflitos on-line, métodos autocompositivos para resolução apropriada de disputas


KEY PHRASES:
non-face-to-face mediation and conciliation, judicial and extrajudicial mediation of conflicts and disputes, online mediation of conflicts, self-composed methods for appropriate dispute resolution

O que é a Mediação

É um processo de resolução de conflitos e disputas, confidencial, voluntário e flexível, onde os envolvidos são assistidos por um terceiro imparcial, o mediador. As decisões advêm dos próprios mediandos e levam em consideração suas necessidades e interesses reais. O mediador apenas facilita, estrutura e coordena o diálogo utilizando-se de habilidades e técnicas específicas desenvolvidas para tal fim.

Segundo a perspectiva da mediação, o conceito de conflito passa por uma reformulação. Este passa a ser visto não como algo negativo que precisa ser suprimido, mas sim como uma oportunidade de mudança e crescimento.

O mediador é aquele que auxilia os envolvidos no conflito a melhor compreenderem a natureza do problema que vivem, fazendo-os ver que conflito é algo normal e corriqueiro nas relações humanas, e que há um modo subjetivo e individual/único de se ver as situações – perspectiva individual – que depende de cada contexto ou circunstância, das experiências vividas, e este modo é descrito pelos sujeitos através de suas próprias narrativas. Ao tomar consciência de seus impasses é que soluções para ambos os lados são encontradas e os conflitos se tornam mais positivos, podendo ser melhor administrados pelos mediandos.

Mediação como Politica Pública Nacional – CNJ

Sem muito alarde, vem tomando corpo aquela que talvez seja a maior revolução cultural brasileira desde Getúlio Vargas: O CNJ (Conselho Nacional de Justiça) adota como política pública e passa a incentivar em 2010 os métodos autocompositivos de resolução de conflitos – resolução nº125 de 29/11/2010.

Poucos são os que percebem a enormidade dessa iniciativa, e a onda de impacto que permeia toda a sociedade brasileira a partir dessa iniciativa. Vivemos em uma sociedade extremamente competitiva, somos acostumados a litigar, a ouvir para apenas responder, menos que para compreender o que ouvimos. Somos preparados desde a infância para ganhar, e ganhar é sobrepor-se ao outro. O conceito de justiça em nossa cultura se confunde, muitas vezes, com punição, que se traduz na reiteração de juízos de valor: certo, errado, bom e mau. A mediação muda este modo de pensar. Antes e, sobretudo, pretende escutar, dar voz ao sujeito. Por ela se busca a valorização da interação e da coparticipação dos envolvidos no encaminhamento de um diálogo construtivo, tudo isso com foco na busca de soluções consensuais, que nada tenham a ver com a pura e simples identificação, dentre os envolvidos num conflito, do vencedor e do vencido.

Nasceu então dentro do Poder Judiciário Brasileiro o principal esforço em direcionar a sociedade brasileira para a sua maturidade, no entendimento da auto responsabilização, na compreensão de que o conflito entre pessoas é a regra na vida e não a exceção, que o conflito não é algo necessariamente negativo, e de que podemos sim ser indivíduos bastantes para administrar nossos próprios conflitos sem precisar sempre recorrer a “um grande pai” (o juízo, o tribunal), aquele que precisa decidir por nós.

Deste ângulo, seria como se o brasileiro abandonasse a adolescência e passasse, enfim, a vida adulta, empoderado, responsável e capaz de dirimir seus conflitos sob uma ótica ganha-ganha de convivência pacífica.

Na mediação, são iguais buscando a autocomposição de seu próprio conflito. Não é mais certo e errado, não é mais ganha e perde, mas sim um encontro autocompositivo para uma realidade fática presente àquele momento. E isso é gigantesco! Essa nova atitude impele o brasileiro à ética, à responsabilidade por si mesmo e pelo próximo, altera sua percepção de mundo, de comunidade e de país, pacificando e engrandecendo nossa sociedade. E sana a grande maioria das mazelas que hoje inferniza nossa sociedade.

A “base” e o “norte” da mediação

A mediação está embasada na resolução nº125 de 29/11/2010, que dispõe sobre a Política Judiciária Nacional de tratamento adequado dos conflitos de interesses no âmbito do Poder Judiciário. Da política pública de tratamento adequado dos conflitos de interesses – a conciliação e a mediação são instrumentos efetivos de pacificação social, solução e prevenção de litígios, e que a sua apropriada disciplina em programas já implementados no país tem reduzido a excessiva judicialização dos conflitos de interesses, a quantidade de recursos e de execução de sentenças;

A seguir, a chamada Lei da Mediação – nº13.140/2015 institui em definitivo o marco regulatório da mediação de conflitos no Brasil. Dispõe sobre a mediação como meio de solução de controvérsias entre particulares e sobre a autocomposição de conflitos no âmbito da administração pública. Aborda e enumera seus princípios éticos e morais, seu norte e procedimentos previstos.

Em mediação técnica de conflitos e disputas, foca-se na moderna teoria do conflito: este – o conflito em si – deixa de ser evitado a todo custo, e agora é visto e abraçado como uma oportunidade de desenvolvimento e crescimento geral. A abordagem do conflito com técnica e preparo é agora um meio de solução de impasses, de crescimento pessoal e profissional, de oportunidade de mudança e de preparo no amadurecimento do ser humano em suas relações pessoais ou profissionais, com auxílio de um terceiro neutro, técnico e imparcial, o mediador.

A pacificação social que os métodos de solução de disputas autocompositivos proporcionam – destaque-se a mediação e a conciliação – superam em muito a tradicional lide jurídica, seja na satisfação dos envolvidos com os resultados, seja no evitar que uma decisão monocrática de magistrado faça de um o perdedor e do outro, o ganhador. É uma forma de transformar uma sociedade como um todo em protagonistas, e não apenas simples crianças dependentes e obedientes a um pai superior que tudo provê, tudo resolve e por tudo é responsável. Uma evolução, respeitados, obviamente, as margens da lei e o inequívoco aceite absoluto às decisões judiciais.

A mudança de paradigma está na transformação da lide processual, fria, técnica, impessoal e objetiva, em lide emocional, cerne dos métodos autocompositivos de solução de conflitos. É o validar sentimentos, o identificar interesses e questões reais, é a entrega do protagonismo aos envolvidos na disputa. Saliente-se a diferença entre os resultados construtivos que a mediação proporciona versus os resultados destrutivos de se aplicar cruamente as normas processuais, decretando vencedor e vencido, rompendo e terminado de vez com qualquer possibilidade de relacionamentos futuros.

Maturidade, compreensão recíproca, humanização e normalização da disputa, validação de sentimentos e interesses inerentes a realidade fática e as redes de pertinência daqueles envolvidos em conflito, manutenção de relações de convivência, e a consequente realização pessoal dos mediandos são a resposta.

Mediação Técnica On-line

Assim como a Lei da Mediação – nº13.140/2015 é considerada o marco regulatório da mediação de conflitos no Brasil, devemos também considerar a Lei da Conciliação e Mediação não presencial – nº 13.994/2020, que veio alterar a Lei nº 9.099/1995 para agora possibilitar a mediação e conciliação não presencial no âmbito dos Juizados Especiais Cíveis, e por consemelhança e extensão, também nas Câmaras privadas de mediação e conciliação, e dispõe que: “é cabível a conciliação não presencial conduzida pelo Juizado mediante o emprego dos recursos tecnológicos disponíveis de transmissão de sons e imagens em tempo real, devendo o resultado da tentativa de conciliação ser reduzido a escrito com os anexos pertinentes.”

Pacificada essa base legal, e devidamente explicada a Mediação de conflitos e disputas, chegamos agora ao ponto focal deste trabalho. Como o mediador pode atuar on-line?

A tela do celular ou computador, o microfone e os alto- falantes/fones de ouvido são uma nova dimensão a ser desbravada pelo mediador técnico, que via de regra deverá ampliar todas as suas habilidades comunicacionais e negociais para superar essas novas limitações que o virtual nos impõe.

Imagine o tamanho da dificuldade que se nos apresenta: existem estudiosos que atribuem 80% do sucesso da nossa comunicação à comunicação não-verbal, que ocorre subliminarmente todo o tempo enquanto interagimos uns com os outros. Como o mediador compensa isso?

Questões simples como “quem é você de verdade ai do outro lado?” ou “você está sozinho ou acompanhado aí do seu lado?” ou “essa sessão está sendo gravada por alguém?” deixam de ser as coisas corriqueiras que são em uma mesa de mediação técnica, e passam a exigir novos cuidados extras, tanto na forma como na aplicação do procedimento de mediação não presencial.

Muitas outras variáveis deverão ainda ser observadas, tais sejam:

  • Uma maior informalidade ou descompromisso na fala ou comportamento dos mediandos, dependendo de onde estarão no momento da sessão – casa, rua, trabalho; ou quem mais dividirá fisicamente ali, com eles, aquele momento;
  • O fato de estar em casa pode representar a poda da liberdade de fala; pode trazer a interferência indevida de terceiros diretamente para essa sessão de mediação;
  • Uma maior ação e influência das redes de pertinência dos mediandos é esperada, pressões externas podem passar a existir, o que não ocorreria diretamente à mesa física de mediação;
  • Como proceder ao nos depararmos com o analfabetismo digital, ou com os excluídos digitais, são questões ainda sem resposta definitiva;
  • Uma gravação ilegal de uma sessão de mediação on-line pode aparecer posteriormente nos tribunais, ou ainda pior, ser usada para chantagem, extorsão, ou exposição pública de um mediando em redes sociais… E muito mais.

Estas são questões práticas e reais, com diferentes graus de gravidade, que a primeira vista desencorajam, algumas até parecem intransponíveis. Entretanto, devemos ressaltar também os ganhos de praticidade e agilidade que a mediação on-line nos proporciona:

  • Nunca será tão fácil agendar um horário único oportuno para todos os mediandos;
  • Nunca um mediador terá a possibilidade de atender um número tão grande de mediações em um único dia de trabalho;
  • Custos com deslocamentos, limitações de horário disponível, não ter com quem deixar as crianças e outros inconvenientes ou dificuldades comuns praticamente deixam de existir.

Sabemos também que nem todo mediador, por mais sólido e competente que seja, será capaz de adentrar a essa nova seara de trabalho, ou mesmo performar nela da mesma forma com que faz nos seus procedimentos presenciais à mesa. Nada mais natural: no escopo geral da mediação judicial ou extrajudicial, nota-se claramente o mediador mais afeito aos conflitos de família, outros mais à vontade com disputas de consumo, outros ainda se especializam em b2b… naturalmente teremos também mediadores melhor vocacionados para o on-line.

Preparo prévio – Escolha das ferramentas – O que esperar

A principal ferramenta para a mediação on-line será o programa/app de videoconferência. A Lei nº13.994 de 24 de abril de 2020 veio alterar a Lei nº 9.099, de 26 de setembro de 1995, para possibilitar a conciliação não presencial no âmbito dos Juizados Especiais Cíveis – CEJUSCs, e diz: “É cabível a conciliação não presencial conduzida pelo Juizado mediante o emprego dos recursos tecnológicos disponíveis de transmissão de sons e imagens em tempo real, devendo o resultado da tentativa de conciliação ser reduzido a escrito com os anexos pertinentes.”

Ato contínuo, os CEJUSCs passaram a testar o programa Webex, uma poderosa ferramenta de videoconferência, um programa/aplicativo com múltiplos recursos, onde estão sendo levadas a cabo as primeiras mediações on-line. O Webex Meeting Center é um aplicativo de videoconferências que faz parte de uma família mais ampla de aplicativos da Cisco Systems, uma gigante estadunidense especializada em TI e Redes, espalhada por todo o mundo e mais do que capaz de produzir uma plataforma de videoconferência segura, robusta, escalonável e leve o suficiente para garantir seu amplo e facilitado uso em múltiplas situações. Esses foram provavelmente os motivos que levaram os TJs a escolherem o Webex.

A principal consideração a ser feita na escolha do sistema de videoconferência que se vai utilizar é a facilidade/possibilidade de acesso ao mesmo por parte dos mediandos. Ele precisa ser simples, pequeno para ser baixado com facilidade e intuitivo, para que mesmo o mediando com menos capacidades possa utilizá-lo. Mas também devemos evitar a simplificação exagerada, lembre-se que sempre devemos emprestar ao procedimento de mediação on-line algum grau de formalidade, de estrutura e ritualismo.

Uma boa combinação tem sido o uso do Webex como sala para as sessões conjuntas e individuais, e o whatsapp como suporte/backup, para o caso de travamentos ou quedas de sinal. Não que o whatsapp deva substituir a sala on-line, apenas servirá como acessório secundário e contatos breves: “_ pessoal, a conexão caiu, já está voltando, estamos aqui, tudo certo” ou coisa similar.

Muito importante esse aspecto, utilizar o whatsapp ou outra plataforma de video chat para um procedimento de mediação seria banalizar o processo, retirar valor e diminuir a importância e o lustro de legalidade do processo de mediação técnica. As mediações devem ocorrer preferencialmente por meio da plataforma Webex Meeting Center da Cisco, sugerida pelo CNJ. Mas sim, o whatsapp pode ser usado como contingência em imprevistos, porém apenas como comunicação de eventual falha da plataforma principal, ou mais comum, uma falha do sinal de internet dos mediandos. Dessa forma, zelamos pela valorização do procedimento de mediação/conciliação, e agregamos valor e eficácia ao nosso trabalho.

Agendamentos e execução – o que esperar:

  • Dúvidas surgirão desde o primeiro contato telefônico para a marcação da sessão, e todas devem ser esclarecidas, todo o tempo. Portanto prepare-se para prazos mais dilatados e muitas dificuldades técnicas. Será você mediador que auxiliará os mediandos a entrarem on-line. Receba seus mediandos com 5 minutos de antecedência.
  • O primeiro passo para garantir que nada dê errado durante a sessão é explicar já no primeiro contato de agendamento a plataforma de videoconferência que utilizarão, como baixar no celular ou computador, como entrar com o link e a senha que você ou sua equipe enviará pra eles.
  • Combinar o backup de suporte pelo whatsapp. Combinar confidencialidade e lembrar da proibição legal de gravação da sessão e suas consequências. Recomendar que o mediando esteja, no momento agendado, em local privativo, confortável, abrigado e seguro. Com um bom sinal de internet. Que reserve uma hora e meia pelo menos para a sessão.
  • É também nesse primeiro contato que o mediador deve decidir se esses mediandos são elegíveis para uma sessão de mediação on-line. Via de regra, pessoas com limitações intelectuais ou físicas (problemas mais comuns – baixa escolaridade e/ou capacidade cognitiva, idosos com dificuldades de manuseio, pessoas com aversão às tecnologias ou eletrônicos), que apresentem muita dificuldade em compreender ou lidar com essa realidade virtualizada/eletrônica, ou que tenham limitações de meios econômicos que dificultam o estar presente on-line (problemas mais comuns – sem crédito ao telefone para ligações e internet, telefone antigo que não suporta o uso do app webex, baterias que não duram tempo suficiente), não devem ser eleitas para a mediação/conciliação on-line.
  • Ao trabalhar remotamente, você precisa ter uma ideia em mente: organização. Quanto mais transparente e organizada for a rotina da sua sessão, melhores serão os resultados. Utilize, por exemplo, a área de chat escrito – mensagem – do sistema de videoconferência como se fosse um seu flipchart virtual, para as fases de organizar ideias, elencar opções, montagem da pauta de negociação, etc.
  • Outra forma possível é você ter essas anotações em seu computador, em formato adequado, e passar a compartilhar a sua tela com seus mediandos quando necessário – recurso esse eficiente também para mostrar pontos, esclarecer quesitos, etc.
  • Talvez o uso do chat de mensagens seja mais prático que o compartilhamento da sua tela, pois disponibiliza o escrito todo o tempo aos mediandos, para que consultem quando quiserem. Simule, faça testes práticos e descubra seu melhor combo de ações.
  • Preparação do ambiente continua sendo item de grande importância na mediação. Poucos segundos após o mediando entrar em videoconferência, ele começará a observar cada detalhe que existir atrás de você, mediador. Portanto, prepare seu palco. Uma experiência visual neutra, sem cores fortes ou objetos que se destaquem e passem a competir com você na tela são a recomendação geral.
  • Nunca foi tão necessário se dirigir e direcionar uma conversa quanto o é no ambiente on-line. Por exemplo, não temos mais disponível a tradicional folha de papel e caneta para os mediandos. E agora? Outra: nas conversas virtuais, existe um cenário típico que acontece com bastante frequência: todos ficam calados, cedendo a vez de falar para seus colegas. Após alguns segundos de silêncio, todos falam ao mesmo tempo e é impossível entender qualquer coisa. E esse ciclo fica se repetindo. Assim também é como os tempos de retrucar e responder, com delay e mais dilatados. E quando você fala, seu áudio é automaticamente cortado pelo sistema, e perdemos com isso vários inícios e fins de frases, informações importantes.
  • Na mediação on-line essa dinâmica intimida o participante, trunca as tentativas de diálogo mútuos, quebram raciocínios e linhas de pensamento, e o pior, frustram as pessoas, as mesmas pessoas com as quais o mediador está se esforçando em promover um rapport adequado, acolher, harmonizar e normalizar.
  • A prática vem mostrando que fechar o microfone dos mediandos se mostra uma má ideia, já que nosso objetivo precípuo é auxiliá-los a conversar. O caos controlado parece ser a melhor opção agora: na fase inicial o mediador “deixa” o caos ocorrer. Em seguida, resume aos mediandos o que está ocorrendo, validando aquela frustração momentânea, esgotando-a, e abrindo uma nova fase mais harmônica nessa mediação. Um ganho extra imediato com essa ação de caos controlado é uma já primeira vitória de ambos os mediandos, que juntos e auxiliados por um terceiro imparcial já dominaram a ferramenta de conferências virtuais. Talvez em futuro próximo o “Caos controlado” passe a ser aceito como mais uma ferramenta técnica para a atuação de mediadores e conciliadores.
  • A atuação do mediador ao passar a palavra, dar voz e vez a cada mediando distribuirá segurança e organização durante toda a sessão. Em uma sessão à mesa, muitas vezes o mediador, por sua sensibilidade, percebe um diálogo mais áspero ocorrendo entre os participantes, mas não interrompe, pois consegue também perceber ali que a comunicação está fluindo. Isso será impossível em videoconferência. As interações serão forçosamente escutar ou falar, nunca ambos, esse é o limite da tecnologia atual. O efeito colateral esperado disso é a dispersão mental do mediando, e a consequente falha de diálogo. A recomendação é que as técnicas de paráfrase e resumo positivado devam ser aplicadas todo o tempo, motivando e mantendo os mediandos em movimento intelectual.
  • O uso de caucus bem curtos, de forma mais frequente também passa a ser uma opção válida. É muito simples e rápido para o mediador suspender temporariamente e trazer de volta um ou outro mediando e entrar em sessão individual nessa ferramenta de videoconferência, o que dará novos contornos ao que passará a ser uma sessão normal de mediação.
  • O cansaço deve ser cuidadosamente observado e respeitado pelo mediador. Mais sessões deverão ser necessárias neste início, pelo menos enquanto essa nova ferramenta da videoconferência é assimilada em nossa cultura.
  • Aqueles que como eu defendem a mediação facilitadora, e nunca a mediação avaliadora, deverão observar que as fases da mediação – Abertura formal, Coleta de informações, Esclarecimentos, Eleição de opções, Negociação e Fechamento – precisam ser bem distintas neste ambiente on-line. Reforçar nos mediandos a percepção de processo, de que cada passo foi uma conquista mútua, de esgotamento de questões, de protagonismo e de legalidade em todo o procedimento. A sessão será assim valorizada, contribuindo para a satisfação dos mediandos, ampliando as chances de acordo e de seu posterior cumprimento.
  • Poderão ocorrer casos onde, por dificuldades técnicas, um dos mediandos só tem voz, e não tem vídeo. Ou, se desativa seu vídeo, a conexão melhora. Aqui a sensibilidade do mediador deverá decidir se vale a pena ou não prosseguir com uma sessão “cega” sem contato visual. É sabido também que as pessoas se concentram e se comportam melhor quando sabem que estão sendo vistas por outros. Via de regra, uma sessão de mediação on-line deve ser completa, com áudio e vídeo de boa qualidade.

Protocolo de ação – Uma linha lógica:

  • No procedimento de mediação on-line, a correta identificação dos mediandos deve ser o item inicial da fala de abertura. Deve ser protocolar e emprestar um certo ritual ao procedimento, agregando-lhe valor e forma adequados. Esse ritual e essa forma visam substituir, em alguma monta, eventuais deficiências de compreensão ou de comprometimento por parte dos envolvidos em conflito que estão ali para serem mediados. Existe, sabemos, uma impessoalidade, ou uma distância fria que os meios eletrônicos de comunicação não presenciais apresentam, que devem ser mitigados com a aplicação desse protocolo de atendimento, buscando assim melhores resultados práticos na mediação on-line, assim como um maior índice de satisfação com o procedimento e o posterior cumprimento dos acordos construídos entre os mediandos.
  • O mediador primeira ressalta a ambos os mediandos o princípio da confidencialidade, e da necessidade ética de que nada seja gravado nesse procedimento, além de possíveis consequências legais. Pergunta textualmente aos mediandos: _ ambos estão de acordo e compreendem a necessidade de confidencialidade do procedimento?
  • Em seguida pergunta textualmente ao primeiro mediando: _ Nome completo, nome da mãe, número da identidade, e endereço completo. E procede a conferência dos dados que já tem. Em seguida, pede ao mediando que segure ao lado do seu rosto, em frente a câmera, sua própria identidade, e faz visualmente uma conferência simples.
  • Nesse momento de identificação o mediador avisa que está “fotografando” o mediando e sua identidade (printa a tela e salva em pdf na pasta do caso em seu computador), e esse arquivo será um dos únicos registros gravados desse procedimento de mediação, equilibrando a confidencialidade com a necessidade prática de se ter registros formais do procedimento. Agradece e diz: “Boas vindas xxxx a esse processo de mediação”. Repete com o segundo mediando.
  • Feita essa identificação ritualizada, o mediando estará qualificado para participar do processo de mediação técnica, e principalmente, motivado, envolvido, se sentirá como admitido e partícipe em um procedimento sério e robusto.
  • Preferencialmente, essa identificação deve ser feita com ambos os mediandos presentes on-line, câmeras e microfones abertos, devidamente conferido pelo mediador se todos veem e ouvem uns aos outros. Dessa forma um mediando valida a identidade do outro – e vice-versa – para o mediador.
  • Quando em caucus – Sessão individual, o protocolo deve ser mantido, colherá os mesmos benefícios.
  • Prosseguir com a fala de abertura padrão/normal, onde o mediador explica formalmente aos mediandos o que é a mediação técnica de conflitos, seus princípios e objetivos, o que é esperado dos mediandos durante a sessão, e como o procedimento deve ou pode ocorrer.
  • Finalizando a abertura vem o “Termo de participação em mediação”, termo esse que os mediandos das sessões presenciais são convidados a assinar, afirmando compreensão e aceitação de participação voluntária nesse procedimento. No ambiente virtual, o mediador substitui por uma declaração verbal de “_ sim, estou de acordo em participar desse procedimento de mediação” de cada um deles. Considerações sobre esse momento ser ou não gravado existem, porém, o arquivo da identidade do mediando, somado ao termo de acordo (ou simples participação) de mediação ao final do procedimento são o bastante.
  • Tempo máximo sugerido para a declaração de abertura: 8 minutos

Conclusão

A Mediação não presencial – à distância – on-line, judicial ou extrajudicial, acabou de nascer e já dá mostras de que veio para ficar. Todos nós sabemos e percebemos que toda a nossa cultura está rapidamente abandonando antigas formas de fazer as coisas em prol das novas tecnologias disponíveis. A humanidade já está às vésperas do 5G, uma tecnologia de transmissão de dados móveis que é para muitos profissionais do setor a revolução da alta velocidade de dados, que virá a literalmente “mudar a cara” de todas as coisas que o ser humano conhece, de uma forma nunca antes vista desde o Windows 3.1 da Microsoft. Nada mais natural e atual, portanto, que as atividades antes adstritas ao presencial passem a deixar de ser, e que consequentes novos padrões e formatos de ação precisem ser inventados, testados e aplicados.

A nós, profissionais de RAD – Resolução Apropriada de Disputas, é delegada a vanguarda da tarefa de criar e implementar novos protocolos de Mediação, dentro das margens estritas do CPC, das Lei da Mediação – nº13.140/2015 e Lei da Conciliação e Mediação não presencial – nº 13.994/2020, assim como das orientações do CNJ e dos TJ Estaduais. Participe também, encaminhe sua contribuição para a criação dos novos protocolos para procedimentos autocompositivos não presenciais de solução de conflitos e disputas para o IMA-Instituto e Câmara de Mediação Aplicada pelo e-mail contato.imainstituto@gmail.com


fonte: Livro Mediação, a Travessia Através da Palavra

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